Thursday, December 23, 2010




Para todos os meus amigos, para os colegas de trabalho, e restantes conhecidos, desejo um Natal muito feliz, com paz, amor, saúde e muita alegria. Que nas vossas casas e famílias a crise não se sinta muito. E que o verdadeiro espirito de Natal habite em vós todo o ano!

Shakespeare - Sonnets 14

Not from the stars do I my judgement pluck,
And yet methinks I have astronomy,
But not to tell of good, or evil luck,
Of plagues, of dearths, or seasons' quality,

Nor can I fortune to brief minutes tell;
Pointing to each his thunder, rain and wind,
Or say with princes if it shall go well
By oft predict that I in heaven find.

But from thine eyes my knowledge I derive,
And constant stars in them I read such art
As truth and beauty shall together thrive
If from thy self, to store thou wouldst convert:

Or else of thee this I prognosticate,
Thy end is truth's and beauty's doom and date.

William Shakespeare

Sunday, November 21, 2010

Alma e os Mistérios da Vida



Todos os que me conhecem sabem que eu adoro ler, e este ano em que fui forçada a tirar uma licença sebática da minha vida académica, aproveito para devorar todo o tipo de livros aos quais consigo deitar a mão. Sinto que estou numa corrida frenética para conseguir ler tudo no mínimo de tempo possível como se a minha vida se escoasse sem que eu alcançasse as metas a que me proponho… Sei que é irracional, mas não consigo o evitar… De qualquer modo, estou a divagar e a fugir do que interessa.
O que me interessa falar é do último livro que li, Alma e os mistérios da vida por Luisa Castel-Branco. A vontade de ler este livro surgiu desde da primeira vez que ouvi a autora a falar do seu romance de estreia e desde do primeiro momento fiquei curiosa e com vontade de julgar por mim mesma a qualidade ou não desta personalidade, porque se por um lado admiro esta capacidade de alguém conseguir se dividir e que nem homem renascentista, ser excelente e talentoso em mais do que uma área, no nosso país desconfio muito da qualidade selectiva dos editores do que é ou não literatura de qualidade. Ou seja, e para me explicar melhor, nós os portugueses somos um povo de poetas e temos muita gente com talento mas que raramente é reconhecida e valorizada. E outros que porque têm um nome sonante, ou participaram num ou noutro reality show vêem o seu trabalho publicado independentemente da sua qualidade. É triste mas é este o mundo em que vivemos hoje em dia.
Mas voltando ao Alma e à Luisa Castel-Branco, devo dizer que gostei muito da história e surpreendeu-me da primeira à última página. Basicamente fala da vida de uma menina muito estranha e inteligente, que tinha contacto com o outro lado da vida, a morte e que teve um começo de vida de rejeição da família de origem, mas que foi bafejada pela sorte quando uma senhora se apiedou dela e trouxe-a para uma vida mais que de conforto de amor verdadeiro.
De qualquer modo, é uma leitura que recomendo com veemência. E já que estamos numa de recomendações, aconselho também a lerem E Depois… de Guillaume Musso, que fala da vida da morte e do poder das nossas acções e do amor.

Soneto do dia de Shakeaspeare:

8. Music to hear, why hear'st thou music sadly?
Sweets with sweets war not, joy delights in joy.
Why lovest thou that which thou receivest not gladly,
Or else receivest with pleasure thine annoy?
If the true concord of well.tuned sounds,
By unions married, do offend thine ear,
They do but sweetly chide thee, who confunds
In singleness the parts that thou shouldst bear.
Mark how one string, sweet husband to another,
Strikes each in each by mutual ordering;
Resembling sire and child and happy mother,
Who, all in one, one pleasing note to sing:
Whose speechless song, being many, seeming one,
Sings this to thee, 'Thou single wilt prove none.'

Incertezas



Vivo o presente em sobressalto
Da dúvida e do medo
Faço o meu assalto
À paz, ao sossego
Não sei o que aí vem
No meu futuro
Vejo um túnel negro
Que me sufoca e aprisiona
Que me afoga e me mata aos poucos
Mas numa ínfima parte
Eu guardo uma luz
Uma esperança que a mudança
Ainda que forçada seja
A bonança chegada
E há milénios esperada.
Mas como está escrito
Pelas musas do destino
Tudo tem de piorar
Antes que possa melhorar…


Inês d'Eça a 31 de Maio de 2010 às 23:51

Soneto do dia de Shakeaspeare:


7. Lo, in the Orient when gracious light
Lifts up his burning head, each under eye
Doth homage to his new-appearing sight,
Serving with looks his sacred majesty;
And having climb'd the steep-up heavenly hill,
Resembling strong youth in his middle age,
Yet mortal looks adore his beauty still,
Attending on his golden pilgrimage;
But when from highmost pitch, with weary car,
Like feeble age, he reeleth from the day,
The eyes, ' fore duteous, now convert are
From his low tract and look another way;
So thou, thyself outgoing in thy noon,
Unlookt on diest, unless thou get a son.

Saturday, May 08, 2010

Há dias....



Há dias em que a luta é difícil demais, há dias em que a vontade de lutar desapareceu. E nesses dias, ainda sem forças, ainda sem vontade, luto, e luto para não me afogar no desespero. E depois…

Há dias em que me lembram o porquê da minha luta, que me dizem que o meu sofrimento serve para alguma coisa, nem que seja para servir de exemplo a todos aqueles que desanimam perante as dificuldades da vida.

Não que eu tenha pretensões de ser o modelo de alguém, sou pequenina e falha demais para tal.

No entanto, nestes dias sinto-me bem por ser como sou, nestes dias fico feliz por ser tão forte, que quase nada me derruba, resumindo…

Há dias em que me orgulho de ser quem sou: uma guerreira !!!


Pensamentos inspirados a 27.02.2010

Soneto de Shakeaspeare do dia:

6. Then let not winter's ragged hand deface
In thee thy summer, ere thou be distill'd:
Make sweet some vial; treasure thou some place
With beauty's treasure, ere it be self-kill'd.
That use is not forbidden usury,
Which happies those tha pay the willing loan;
That's for thyself to breed another thee,
Or ten times happier, be it ten for one;
Ten times thyself were happier than thou art,
If ten of thine ten times refigure thee:
Then what could death do, if thou depart,
Leaving thee living in posterity?
Be not self.will'd, for thou art much too fair
To be death's conquest and make worms thine heir.

Thursday, February 04, 2010

Homenagem a um grande mulher portuguesa

Morreu Rosa Lobato de Faria (1932-2010)…

• Fiquei naturalmente chocada quando soube da notícia, pois embora só recentemente tenha me apercebido da sua escrita genial, do seu humor extraordinário, e posso com toda a certeza dizer que sem ela ficamos mais pobre. Porque a sua contribuição para o panorama literário, dramático e musical foram preciosos demais para o pouco reconhecimento que ela mereceu. Ainda há pouco tempo falava dela como escritora a uma amiga e dizia como era surpreendente esta faceta dela, pois através da escrita ela demarcava-se em absoluto da imagem de Tia snob que emprestou a muitas personagens e que a faziam parecer muito inacessível. Foi com uma alegre surpresa que verifiquei a falsidade desta impressão no dia 13.06.2005, quando com uma simpatia impressionante ela me assinou o livro de poemas que hoje elejo como favorito na categoria de poesia: " A Gaveta de Baixo" e lamento nunca ter tido oportunidade de lhe dizer que sim gostei muito desta história de amor e que já tinha lido outras coisas dela e que me tinha surpreendido, quer pela força dos textos, quer pelo humor picante e delicioso que não nos deixa indiferentes. E quanto á carreira dela de actriz, ainda me lembro de numa novela ela viver nas torres das Amoreiras e ser uma mãe muito chata que infernizava a vida aos filhos. Não me lembro do nome da novela mas sei que era em plenos anos 80. De qualquer modo, também vou sentir falta das letras que ela fez e fazia para muitas canções desde fados a músicas do euro festival já que ela tinha a capacidade cada vez mais rara de brincar com as palavras e fazer das músicas eternos hits. Lembro-me da música de uma novela recente da sic, "Podia acabar o mundo", a música da Dina "amor de água fresca." E como estas muitas outras, que nunca esqueceremos e que dificilmente encontrarão par em talentos mais actuais. E gostava de si, querida Rosinha, vou sentir a sua falta, mas vou continuar a ler os seus livros e desse outro plano fique a saber que é a minha escritora preferida, de todo o panorama literário português. E a melhor homenagem que posso fazer é deixar o Shakeaspeare em standby e transcrever o meu livro/poema favorito que me autografou na feira do livro de Lisboa de 2005, e aconselhar a todos os que me lêem para procurarem conhecer melhor o talento imenso desta mulher extraordinária, pois além deste livro poema que conta com ilustrações maravilhosas de António Oliveira Tavares, deixou muita poesia e romances dignos de nota. Até sempre, descanse em paz e seja feliz sempre:

I

1. Quando o móvel chegou era novo. Cheirava
Como nós a mel de abelhas a avenca
Da floresta.
O tampo doce
Pedia cera, panos macios.

As gavetas aceitavam quase tudo.
Por respeito
Guardámos apenas linhos bordados
Lenços antigos, leques.
Uma caixa de charão cheia
De bugigangas que nunca nos atrevemos a deitar fora
Um pedaço de renda um búzio
Um dedal de prata uma
Boquilha loira de nicotina
Uma borla dourada
Três dados de marfim.

Na gaveta da esquerda ficou
À espera de ser reclamado
Um livro emprestado de poesia
Com uma assinatura desconhecida
E uma data.

Outras gavetas ficaram vazias.

Só o tempo na sua sabedoria
Poderá enchê-las.

Festejámos o móvel como se
Fosse um amigo.

2. Agora o móvel tem um espelho
Por cima. Estreitinho
E muito largo
Que é uma forma de ser
Dos rectângulos.

A sua alma de espelho
Reflecte à noite o perfil
Da lua entre cortinas
De manhã os nossos rostos ensonados
De tarde as esperas.

Agora o móvel tem uma terrina antiga
Rosas brancas livros. Cheira
Menos a mel e mais a alfazema.

O outro livro já não está na gaveta.

Sabemos agora que o seu antigo dono
Não virá reclamá-lo. A estante
Onde moram os poetas acolheu-o
Com a generosidade que os poetas
Costumam ter.

A gaveta da esquerda tem agora
Muitas fotografias de momentos
Passados. Memórias de almas roubadas
Paralisadas no tempo.
Donde vínhamos, para onde íamos
As fotografias não mostram. Por isso,
Dormem sorridentes ou amuadas
Na gaveta da esquerda.


A caixa de charão ganhou mais
Tesouros inúteis. Dois isqueiros
A tampa de uma boa caneta
Um baralho incompleto um colar
De missangas rebentado uma
Tesoura desajustada por cortar linhas
Indevidamente.

Na gaveta de cima há agora documentos
Papéis carimbados certidões cartões
Disto e daquilo.

Para pôr alguma distância entre
A burocracia e a vida fechamos
Essa gaveta à chave.


3. Já ninguém controla o espaço nas gavetas.

Lembro-me de guardar ali a lã
Semidobada numa tarde
Em que chegaste mais cedo
Com olhos de viagem
E as mãos de urgência.

Falaste-me de Paris amaste-me
Tiraste para mim a mala
Do alto do armário.

Beijámo-nos infinitamente
Com javas e impressionistas no coração.

Quando partimos
O móvel ficou a olhar-nos da penumbra.


4. As gavetas ficaram a abarrotar
De lembranças para os amigos.

Há também guias Michelin postais
Vitórias de samotrácia hermafroditas
Almoços na relva banhistas.

Há dias felizes fechados nas gavetas
Como um aforro para os dias difíceis.

E quando o luar vem vagarosamente
Amotinar as sombras e realçar
O invisível
O móvel parece satisfeito
Com a sua gravidez de segredos.

Só a gaveta de baixo permanece vazia.


5. Hoje não vieste.

Eu já tinha visto nos teus olhos
Aquela ausência distraída
Aquela meia-verdade
Aquela curva fugidia do dorso
Como se nascessem asas
E tivesses de voar.

Há dias que
A nossa cama é um lugar para dormir
A nossa mesa um lugar para comer.

Antes não era assim.

Pus flores de sabugueiro na entrada
Doce de ginga na compoteira Haendel
Por toda a casa.

Olhei-me no espelho por cima do móvel
E achei-me bonita
Com o teu amor estampado no meu rosto
E a roupa florida
Dos dias mais longos.
O gato esperou-te
Com a ponta negra do rabo
Arrumadinha sobre as patas juntas.

Da gaveta da esquerda tirei
Aquela fotografia que nos mostra
Abraçados com a Torre Eiffel ao fundo
Num cliché
De felicidade pateta e entalei-a
Numa moldura de pinho.

Gelei o vinho e acendi o fogo.

Não vieste.

6. O sol já não bate na esquina do móvel
Como se todas as horas
Fossem cinzentas

O vento breve que atravessa a casa
Perdeu a memória do teu cheiro
Tem uma forma triste de oscilar
Nas cortinas de estremecer
A fímbria da camilha

Já não traz um recado de feno
Nem um rastro de voos azuis

Perpassa nas minhas sandálias
Beija-me os pés geme
Na frincha da porta que fechaste.


7. O dia-a-dia ainda está aqui
Mas a tua ausência empurra-o
Para uma banalidade quase
Rídicula quase trágica
Quase sórdida

Tento sublimar os pequenos
Gestos rotineiros seguro
O pão e penso toma-me
Entorno a água e digo
Bebe-me

E de súbito a saudade é uma
Gazela furtiva
Parada silenciosa ao pé do nosso
Móvel
Roça a cabeça nos puxadores das gavetas
Fala de distâncias que não conheço
De uma ausência
Que não cabe no peito

Seguro o ventre
Enrolo-me no chão

E grito.


8. Reaprendo o caminho das mãos
Através do inútil.

Releio incansávelmente
A tua única carta.

Não choro, penso.

Quero ainda seguir o teu voo
O trilho que soube convidar os teus passos

Sentir o que sentes
Levar o coração ao teu destino.

Estendo as mãos para a luz
Ficam acesas como se o teu corpo
As convocasse.

Tecemos um amor indestrutível.

A vida é que não sabe.


9. Vieram os amigos. Enrolaram
Os pés nos tapetes. Recusaram
O gelo na bebida
Para não dar trabalho. Constataram
A tua casa cheira a alfazema,
É da cera do móvel, deram
O seu recado solidário
E partiram sem compreender.

Estranham que eu diga asas
Ressentem que eu mencione espaço
Escandalizam-se com os meus olhos secos.

Já de saída
Uma mulher que mal conheço
Instila no meu ouvido uma verdade
Que faço por esquecer.

Fico encostada ao móvel. De mim
Caem todas as folhas
Do meu primeiro Outono.


10. Com que pedra de sal
Com que promessa
Com que pássaro solto pela casa
Com que folha de louro
Com que sonho
Com que lua entornada no alpendre
Com que livro de quem
Com que sonata

Temperarei a dor da tua ausência
O silêncio
O vazio na minha cama
Os gritos do meu corpo
O pão por repartir da minha alma

Com que chuva
Lavarei o rumor dos teus passos
No magoado coração dos dias

Com que pranto
Afogarei teu rasto
Com que manto de lava
Com que mar.


11. Quero que me leves ao rio
Disseste
Quero que me leves ao rio
E faças remos dos meus braços
Para te navegar de madrugada

Quero que me leves ao mar
Disseste
Quero que me leves ao mar
E me faças de espuma e de vento
E me ofereças um peixe de prata

Quero que me leves á fonte
Disseste
Quero que me leves á fonte
E de mim faças cântaros brancos
Abraçado por tuas mãos d'água

Quero que me leves para casa
Disseste
Quero que me leves para casa
E me deites em rendas de lua
Transbordado na tua almofada.


12. Vou á procura dos meus velhos poemas
Encontro um do tempo da bonança
Tão totalmente seguro da sua eternidade
Que agora sim os meus olhos chovem
Uma poalha mansa, matinal.

Os teus dedos dobaram os meus sonhos
Com fios de lua beijos e segredos…

De joelhos sobre os calcanhares
Inauguro a gaveta de baixo.

II

1. Há uma conspiração
De silêncio entre
O inverno e o branco embainhado
Dos meus lençóis.

Neva todas as noites
Na minha cama.

É por isso que ás vezes me levanto
E construo poemas solares
Estórias de verão
Livros incendiados.

É por isso que aqueci o meu ventre
Com esta breve palpitação
A que chamo
Estrela
Borboleta
Carícia

Boa nova.



2. Guardei na gaveta de baixo
A flor que trazia nos dedos
À hora de advinhar-te.

Primeiro
Foste apenas uma ideia
Que me segurou na porta
Da cozinha quando ia
Meter numa garrafa verde
Um malmequer amarelo.

Fiquei ali
À espera que te transformasses
Em certeza ou em música.

Lembro-me que havia um sol bonito
A enquadrar a cesta dos pimentos

Lembro-me do chiar mansinho
Da panela da sopa

Lembro-me do gato.

Olhou-me
E li nos seus olhos feiticeiros
O recado que os teus
Ainda não podiam dar-me

Soube que tinhas sido
Arremessado à praia do meu corpo
Pela espuma desfeita
Das vagas de Setembro.

Como um grão de areia
Uma pepita de ouro
Um búzio

Pude então mover-me andar
Sorrir de novo
Abrir a gaveta de baixo
Guardar a flor do meu segredo.



3. O meu corpo entretém-se.

Tece os teus dedinhos de pés
Que são
Juntamente com o sorriso involuntário
O que mais nos deslumbra
No recém-nascido

O meu corpo ocupa-se

De ti que o ocupaste
E entrelaça veias nervos
Unhas músculos cabelos

O meu corpo transcende-se

Inventa
O teu imponderável coração.


3. Eclodes
Como um nenúfar no lago
Da minha espera

Não posso imaginar nada mais belo
Assim feito de luz
E carne e pétala

Feito de lua nova e madrugada.

E já que bebes todos os meus rios
Deixa passar a mágoa
Como um barco
À hora do crepúsculo

Deixa passar a mágoa

Não quero adivinhá-la na névoa
Dos teus olhos

À chegada.


5. Com a mesma lama
E os mesmos astros com que te
Construo

Arquitectei um livro
De arcos de volta inteira
Botaréus rosáceas
Vitrais policromos

Um novo livro
Onde portas em tímidas ogivas
Abrem para penumbras
Mistérios amores segregados
Enredos antigos

Mas não ouso rasgar-lhe janelas

Ainda

Receio ver o mar.


6. Ando grávida grávida grávida
De ti que és verdade
Deles que são ficção.

Hei-de pari-lo antes de ti
Ao meu estúpido livro
Para que nos deixe em paz
Na nossa solidão partilhada.

Para que não
Roube a tua seiva
O teu sangue
O teu leite

Não é o teu gémeo é teu vampiro.

Então
Puro e sábio
Segredas-me que devemos amá-lo

Devolveu-te a esperança dizes
Abrasou de palavras
A catedral da ausência.


7. Quando ele nasceu

Com suas mãos de papel
E seus olhos de letras

Guardámos uma cópia
Na gaveta de baixo

A decisão foi tua

Disseste-me
Com grandes gestos de pés
E ondas subaquáticas
A vibrar no meu âmago

Que devia tê-lo à mão porém
Resguardado de olhares

É por ti
Pelo teu corpo de asa palpitante
Que hão-de florir de branco
As rosas do alpendre.


8. Os dias são mais longos

O vento cheio de sol e polén
Entontece-me um pouco

Mas levei-te a passeio
Oscilando
No teu pequeno mar

No meu peito sinto já
O mistério das fontes

As nascentes sagradas
Que hão-de valer-te na fome
No sono na doença
Na sede

E no amor.


9. À noite
Encostas a cabeça
Ao rumor do meu coração
E perguntas onde está o teu pai.

Como dizer-te os caminhos
De um vagabundo de sonhos
De um nómada
De imagens desconhecidas?

Às vezes, conto, ele tenta
Pintar a alma dos silêncios
O suspiro dos pássaros
O coração das cerejeiras

Ninguém sabe de que azuis
Anda enfeitada a sua mágoa
De que cinzentos
Desponta a sua alegria

Há-de trazer-te uma tela
Ardente de todos os sóis
Molhada de todos os rios

Ou tão somente
Uma pequena pedra
Que encerre
A explicação dos ventos.


10. Tirámos da parede
O espelho rectangular por cima
Do nosso móvel

Porque não quero
Suspeitar do fazedor dos orvalhos
Que habita a minha íris

Fomos buscar
A tela de brancos improváveis
E aldeias-fantasma

Pendurámo-la com esforço
Em seu lugar

Para que te habitues
Com a luz e a sombra
A neblina e a terra
O barro e o granito

A que chamamos pai.



11. E assim
Imperceptivelmente
Vamos sendo mudança

Eu tu e a casa

Já não me servem os vestidos
Floridos de outras primaveras

A ti já não te basta
O teu mergulho quente
Os regatos de sangue

A casa trocou de mão
Objectos e cheiros
Sugestões de temperos
Flores e frutos

Fiz o teu ninho no meu quarto
Ao lado do coração.



12. Vimos chegar as andorinhas
Conjugarem-se as estrelas
Impacientarem-se os ventos

Agora
Esperamos o verão do teu nascimento
Tranquilos, preguiçosos

Tão inseparáveis as nossas fomes
Tão emaranhadas as nossas veias
Tão indestrutíveis os nossos sonhos

Espera-te um nome
Breve como um beijo
E o reino iluminado
Dos meus braços.

Virás
Como a luz maior
No solstício de Junho.


III

1. Estou ajoelhada a procurar
Saudades
Na gaveta de baixo

Ouço a chave na porta digo
Maria estou aqui a remexer
Na gaveta das mágoas
Já me custa

A tua figura descuidada
Preenche
O rectângulo da porta

Com a mão esquerda seguras
O blusão de ganga sobre o ombro
Na direita o livro de capa lilás
Um raminho silvestre

Dá-me um autografo, dizes.

Levanto-me pesadamente
Arredondo o ventre até ao coração
Para que saibas
Que nem por um momento
Me deixaste sozinha

Beijas-me infinitamente como dantes
A minha garganta está tão apertada
Que a língua não consegue mover-se
Ao encontro da tua

Sem palavras
Deponho nos teus braços
Para que a carregues
A nossa primavera consagrada

Devagar
Com a planta feliz do pé descalço
Empurro adio encerro
A gaveta de baixo.

Rosa Lobato de Faria
Dezembro de 1998.

Festa

Aqui estão as fotos do meu jantar de 32 anos. Uma noite bem passada em boa companhia.


Teresa



Pedro


Maria e Nuno (à esquerda), Inês e Pedro (á direita)


Foto de família: Nuno e Inês Fontinha, Teresa, Pedro e Maria Manuel, eu, Wilson, Sheila, Paulo, Bia, Litta e Ricardo



O grupo do costume : Maria, Nuno, Teresa, Inês Fontinha e eu. (O André Sarafana também esteve mas como não podia comer foi logo embora e não ficou na foto, mesmo assim, obrigada por ires André mesmo com dores, és um amigÃO)


A Litta e o namorado Ricardo



Eu e o Will


Sheila, eu, a Bia e a Litta



Eu e o champanhe


A Maria linda que estava esta noite a achar que há algo estranho no bolo (por gozo os nºs estavam trocados)



Paulo Avelar


A idade real (números grandes)

Soneto do dia de Shakeaspeare:

4.Unthrifty lovelyness, why dost thou spend
Upon thyself thy beauty's legacy?
Nature's bequest gives nothing, but doth lend;
And, being frank, she lends to those who are free.
Then, beauteous niggard, why dost thou abuse
The bounteous largeness given thee to give?
Profitless usurer, why dost thou use
So great a sum of sums,yet canst not live?
For having traffic with thyself alone,
Thou of thyself thy sweet dost deceive.
Then how, when nature calls thee to be gone,
What acceptable audit canst thou leave?
Thy unused beauty must be tomb'd with thee,
Which, used, lives th'executor to be.

Eu Quero


Eu quero
Ser amada
Acarinhada
Desejada
Ansiada
Cuidada
Por alguém
Que todos os dias
Me prove o seu amor
Com acções
E não palavras
Por vezes vãs e falsas

Eu quero
Cuidar de alguém
Tratar essa pessoa bem
Se ele assim merecer
Poder de novo
Sonhar e planear
Desejar ter os seus filhos
Encontrar a luz
Do seu olhar
E a bondade
Do seu coração.

Eu quero
Construir um futuro
Melhor e mais feliz
Vivenciando verdadeiramente
Uma vivência a dois
Ser ouvida e entendida
Ser aceite e admirada
E que valorizem
O que é importante para mim.

Eu quero
Um amor feliz
Saudável e companheiro
Sem mágoas, sem prisões
Sem cobranças ou recriminações
Sem tristeza e mágoa
E sem esforço e dor

Eu quero
De novo ser feliz
Viver a vida em pleno
Dizer de novo
Que de nada me arrependo
Mas que desta vez
Seja verdade sempre!
O sonho por fim realizado
O sentimento sublimado

Eu quero
A paz dum sorriso
A certeza dum carinho
A força de um apoio
A alegria da partilha
A ternura do amor
O carinho do respeito
A dedicação do cuidado
A generosidade da Alma.

Eu quero
Eu preciso
Eu mereço
Eu desejo
Eu vou ter
Eu mereço ser feliz
Eu vou ser feliz!

Inês D'Eça
10.09.09


Soneto do dia de Shakeaspeare:



3. Look in thy glass, and tell the face thou viewest
Now is the time that face should form another;
Whose fresh repair if thou not renewest,
Thou dost beguile the world, unbless some mother.
For where is she so fair whose unear'd womb
Disdains the tillage of thy husbandry?
Or is he so fond will be the tomb
Of his self-love, to stop posterity?
Thou art thy mother's glass, and she in thee
Calls back the lovely April of her prime:
So thou through windows of thine age shall see,
Despite of wrinkles, this thine golden time.
But if thou live, remember 'd no to be,
Die single, and thine image die with thee.

Thursday, January 28, 2010

Não acredito em vampiros, mas que os há, há...

Numa altura em que nos fartamos de ouvir falar de vampiros (sim, porque eu até posso gostar do género de filmes e séries mas acho que o que é demais é demais, pois além dos filmes não há um canal que não vá iniciar uma série ou novela do tema, irra - até tira o prazer da coisa) resolvi falar dos verdadeiros cvampiros. Por que sim, eles existem e são bem diferentes dos politicamente correctos Cohen da saga de Setephenie Meyer, ou dos tenebrossos clássicos do cinema ou ainda dos cómicos de filme "Amor á primeira dentada" dos anos 80. Não, nada disso, falo dos que nos rodeiam todos os dias, aqueles que nos sugam as energias, através de uma convivência conflituosa, porque só no conflito se sentem bem, e que com o mau ambiente que criam ao nosso redor, destróem os nossos nervos só por não aguentarem nos ver com vidas mais felizes e preenchiodas que eles. Ou os que pertencendo ao nosso circulo mais intímo de conhecimentos, como família ou amizades, nos sugam o amor-próprio, a autoconfiança, que nos manipulam á sua vontade. Ou aqueles maridos ( e algumas mulheres) que violentam a(o) companheira(o) fisica e/ou psicológicamente e os filhos, criando uma destruturação na família e uma convivência diária com a violência, naquele que devia ser um porto de abrigo ao desenvolvimento pessoal de cada um. Ou aqueles colegas de trabalho ou superiores que não nos respeitam, e se aproveitam dos nossos esforços para auto-promoção, ou exploração disfarçadamente descarada, e sem qualquer respeito desprezxam e deitam fora o trabalho válido, por não saberem funcionar em equipa, o que gera stress e insatisfação.
Mas o mais grave, é que estes "vampiros" não podem ser identificados pela ausência de reflexo no espelho, pela exposição á luz solar, nem por só nos cruzarmos com eles á noite. Não estes "vampiros" aparecem a todas as horas do dia em todas as situações possíveis e imaginárias e não podemos nos defender deles nem com cruxificios nem com alho, e muito menos com prata. Nem mesmo os identificando podemos espetar uma estaca nos seus corações. Por isso, tudo o que podemos fazer é ter muito cuidado com as pessoas com quem nos relacionamos, e se as identificarmos, então fugirmos a sete pés o mais rápidamente possível antes que nos suguem a nossa energia vital, a nossa alegria e a nossa tranquilidade.

Soneto de Shakeaspeare do dia:

2.

When forty winters shall besiege thy brow,
And dig deep trenches in thy beauty's field,
Thy youth's proud livery, so gazed on now,
Will be a trotter'd weed, of small worth held:
Then being asked where all thy beauty lies,
Where all the treasure of thy lusty days;
To say, within thine own deep-sunken eyes,
Were an all-eating shame and thriftless praise.
How much more praise deserved thy beauty's use,
If thou couldst answer, 'This fir child of mine
Shall sum my count, and make my old excuse',
Proving his beauty by succession thine!
This were to be new made when thou art old,
And see thy blood warm when thou feel'st it cold.

Thursday, January 21, 2010

O Bom e o Mau...


.... da festa!

Eu tenho o hábito de usar o meu aniversário para fazer uma festa, utilizando a data como uma justificação para juntar todos os meus amigos.
E por enquanto, o habitual é juntá-los num local público porque ainda não conquistei a minha independência para o poder fazer num cantinho só meu, ou seja, naquela que será a minha primeira casa. Mas de qualquer forma não deixo de sonhar com o dia em que o poderei fazer várias festas nesse meu espacinho.
E, embora eu adore ver o quanto eu sou querida pelo número de amigos que raramente falham a partilha desta celebração, e me sinta feliz por estar com eles, esta data também traz sempre coisas menos boas.
Todos os anos, há sempre alguém que não respeita a data indicada para a confirmação de presença, há sempre aqueles que nem confirmam se estarão ausentes ou não, o que me deixa sempre no dilema de guardar ou não lugar para essas pessoas, o que por sua vez dá azo a que aconteça uma de duas situações nada agradáveis: 1ª) Acabo com lugares vazios e mesas a serem reclamadas pelos empregados do restaurante; 2ª) e como veio a acontecer no ano passado (por minha culpa e por respeito aos outros ter feito as coisas em cima da hora) a mesa e os lugares não chegam para os convidados e os últimos a chegar tiveram que ficar espalhados por mesas próximas...
Eu não sei se sou só eu que penso assim, mas a mim estes aborrecimentos escurecem um pouco a alegria e o brilho destas noites e deixam-me por vezes à beira da desitência de organizar estes jantares. Eu sei que nem todas as pessoas têm o mesmo tipo de educação e aceito bem as diferenças dos meus amigos, mas se eu tenho o máximo de consideração pelas pessoas de quem gosto, seria demais esperar o mesmo delas???
E, como se não bastasse ( e embora eu aceite a maioria das desculpas como razões válidas) há ainda aqueles que depois de terem confirmado a presença, desistem há última da hora, por este ou aquele motivo.
A verdade é que apesar destes "amargos de boca", só faz falta quem lá estiver e a noite costuma correr bem e é sempre divertida.
Mas estou a ficar velha e às vezes sinto que me falta a paciência para passar todos os anos por estes stresses e espero que no dia em que for a feliz dona do meu espaço, isso já não me aborreça nem me preocupe, pois pretendo ser uma excelente anfitriã e como tal nunca faltará comida, bebida ou diversão aos meus convidados e haverá sempre espaço para mais 1, 2, 5 ou 10. E sei no fundo da minha alma, que farei da minha casa um lugar onde os amigos se sentem bem e querem sempre voltar...


Soneto do dia de Shakeaspeare:


1.

"From fairest creatures we desire increase,

That thereby beauty's Rose might never die,

But as the riper should by time decease,

His tender heir might bear his memory:

But thou, contract to thine bright eyes,

Feed'st thy light's flame with self-substancial fuel,

Making a famine where abundace lies,

Thyself thy foe, to thy self to cruel.

Thou art now the world's fresh ornament,

And only herald to the gaudy spring,

Within thine own bud buriest thy content,

And, tender churl, makeast waste in niggarding.

Pity the world, or else this glutton be,

to eat the world's due, by the grave and thee."

Monday, January 18, 2010

Envelhecer


Todos os dias desde que nascemos, envelhecemos, embora enquanto somos crianças a isso se chame crescer…
Chegando á maioridade já não nos é permitido crescer, senão no carácter.
Ainda assim apreciamos as experiências que vivemos e tentamos aprender com elas de modo a que cada dia sejamos uma pessoa melhor, e com a aprendizagem que a vida nos dá, aprendemos a não cometermos os mesmos erros.
Por isso, o envelhecer tem tanto de mau quanto de bom. E mesmo que eu esteja com 32 anos e longe de alcançar tudo aquilo que mais desejo, tenho a esperança de que este será o ano em que a minha vida finalmente se encarrile e eu consiga lançar as bases da minha futura casa e família.
Sim, minha futura família, porque mesmo hoje estando sozinha eu nunca desistirei deste sonho e de uma maneira ou outra irei consegui-lo.
Porque aprendi que não necessito de um homem para cumprir este sonho. Pois se é bem verdade que preferia a família tradicional, quando a minha vida estiver estabilizada eu vou resolver esta questão de uma maneira ou de outra, e se a pessoa certa entretanto aparecer, só será a pessoa certa se aceitar os meus filhos, sejam eles adoptados ou produção independente, e os tratar como filhos sem nunca os maltratar.
Quanto à figura paterna, tenho amigos que gostam de crianças e poderão sempre ser o exemplo a seguir e eu tudo farei para que nada falte aos meus filhos.
Porque eu nasci para ser mãe e não será uma insignificância como ser solteira que o vai impedir ou que vai fazer com que os meus filhos não sejam saudáveis quer física quer mentalmente.
E talvez um dia, eu possa olhar com calma e tranquilidade para o meu passado com a certeza que vivi uma vida plena, realizada e que tomei as decisões correctas e fiz dos meus filhos pessoas com valor que tornarão este mundo cão num mundo melhor. E com isto poderei partir com a certeza que cumpri a minha missão.
Livros lidos: A Filha da Floresta – Juliet Marillier
O Filho das Sombras – Juliet Marillier
Amados Cães – José Jorge Letria

Livroas a Ler: A Filha da Profecia – Juliet Marillier
A Marca das Runas – Joanne Harris

Livros próximos: O Herdeiro de Sevenwaters – Juliet Marillier
Sapatos de Rebuçado – Joanne Harris

O Suicídio

O Suicídio - Short Story
by
Inês D'Eça
A relação deles durou muito mais que muitos casamentos devido essencialmente aos esforços que ela fizera para que a relação resultasse. Ele apenas se limitara a esperar de mãos cruzadas que a vida e os sonhos caíssem no seu colo sem grande esforço.
Ela farta de críticas, de desrespeito, de indiferenças, de faltas de atenção e de educação, tinha posto um ponto final no inferno que se adivinhava a sua vida de casal ( e tão simplesmente, só porque ele recusava a viver a relação com o companheirismo próprio de quem tem um projecto de vida a dois).
Ele, primeiro, e como é típico do género masculino, reclamou, tentou pôr em causa a fidelidade dela (como se para os homens essa fosse a única razão que leva as mulheres a terminarem relações doentias) e estrebuchou, ferido de posse, mas como acomodado por natureza, bem depressa se acomodou ao fim da relação, tal como se havia acomodado há mesma.
Durante um tempo, ficou a amizade, mas após uma ida a um cinema, ela tornara-se esquiva, por não se sentir confortável junto dele, e ele após dois meses e meio de distância começou a persegui-la com desculpas obscuras para se encontrar com ela.
Ela já não o compreendia. Teria ele levado todo aquele tempo a assimilar a sua perda, quereria a recuperar sem ter feito nada para a reconquistar? Até quando é que ele pensava que a podia manipular?
De qualquer modo, já havia algum tempo que não se viam e iam-se encontrar nos anos de uma amiga comum aos dois. A festa seria numa casa dos pais do marido dela e cujo andar era relativamente elevado.
Primeiro limitaram-se a conversa de circunstância, mas num momento de maior exaltação da festa ele pediu-lhe um momento a sós, ela primeiro resistiu, mas a insistência foi tanta que ela concedeu uns minutos na solidão e tranquilidade oportuna do quarto de casal amigo.
Quando ele se viu sozinho com ela, começou com a voz embargada:
- “ Eu tenho sentido muita a tua falta, quero que voltes para mim… Percebi que não te quero perder e quero realizar contigo os sonhos que construímos juntos durante todos estes anos, e olha, até aceito te dividir com o teu cão!”
Ela olhou-o boquiaberta, deu um riso irónico, cheia de mágoa, ressentimento, revolta e incredibilidade:
- “ Tu estás doido ou estás a gozar comigo? O que é que achas que fizeste este tempo todo, que me fizesse, de alguma forma, achar que valia a pena tentar mais uma vez? Que tens feito para me provares que lutas por mim? Sim, ainda te amo, mas de que me serve esse amor? De nada, tal como nada tens feito. Tu acabaste com a fé que eu pensava inabalável da força do amor, porque essa força só é possível quando as duas pessoas lutam por ele. E eu estou cansada de lutar, já não tenho, nem quero dar mais nada a este amor doentio. Estou vazia. Por isso, esquece, esquece-me, cada dia estou mais certa de que fiz bem em terminar a nossa relação, porque contigo eu seria infeliz todos os dias da minha vida, e eu não mereço isto, muito menos sou a Madre Teresa de Calcutá para ser infeliz em nome de um amor que não vale a pena! E já agora, agradecia que parasses de me assediar ou arriscas a perder também a minha amizade e eu esquecerei até dos bons momentos que vivemos!”
- “É a tua última palavra?”
-“É!”
Então ele sorriu, abriu a porta da varanda, olhou para ela, novamente com aquele sorriso estranho e fugidio e com um pulo sentou-se no parapeito da varanda e disse:
-“ Assim sendo, não me deixas outra alternativa…”
-“ Que estás a fazer?” – disse ela, alarmada. –“Não sejas estúpido e egoísta, desce daí, isso não te servirá de nada!” – e enquanto dizia estas palavras, ela recuava para a porta do quarto, com medo que qualquer passo na sua direcção o precipitasse no vazio. –“Tu podes não vir a ter um amor igual ao que eu te dei, mas ainda tens tempo de encontrar alguém que goste de ti. Nem com todo o amor que te dei eu valho a pena ao ponto de tomares essa atitude. Pensa bem. E se queres fazer isto só para me castigares, para que eu fique com remorsos, será em vão e só vais magoar os teus pais, pensa neles, a minha consciência está tranquila. E eu sei que nada mais pude, posso ou poderia fazer por nós. Não sejas infantil, precisas de ajuda, e eu ajudo-te a arranjá-la e vais deixar de sofrer, mas não faças isso, não vale a pena!”
Ele voltou a sorrir, riu, disse adeus e deixou-se cair, enquanto ela congelava por dentro e abria arregalados os olhos incrédulos, enquanto na garganta se formava e prendia um grito surdo.
Durante um segundo ela sentiu o tempo parar, como se tudo se encontrasse suspenso, ela não conseguia se mexer e os sons que lhe chegavam aos ouvidos faziam a cena desenrolar-se perante os olhos abertos e fixos no vazio de onde ele se jogara, e com o olho da mente ela viu, o baque surdo do corpo dele na calçada, os gritos dos transeuntes, alguém a gritar : “Chamem uma ambulância!”
Nas suas costas, a festa prosseguia até que alguém se apercebeu da mudança dos sons da rua e chamando os outros se dirigiu ao quarto e ao passarem por ela e perguntarem-lhe por ele, olharam pela varanda e perguntaram o que tinha acontecido.
Ela não se mexeu, nem o conseguia fazer, mantinha-se estática, pálida e apaticamente de olhos abertos, sem diminuição da incredibilidade sentida pela situação, até que alguém a agarrou pelos ombros, tentando fazê-la reagir e com esse toque tudo ficou negro e ela caiu inconsciente.

Quando ela acordou, e embora não se tivesse apercebido de imediato, estava num hospital com um dos seus amigos ao seu lado…
Ainda sem bem avaliar onde ela estava, conta tudo o que se passara como se dum pesadelo se tratasse, pois a sua mente ainda perturbada não conseguia apreender a realidade dos factos, o amigo pega-lhe na mão e com um ar taciturno responde-lhe:
- “ Lamento muito, mas não foi um pesadelo, estás em choque e por isso estás aqui. Tens que te recuperar, isso é o mais importante agora!”
- “Então… ele foi assim tão cobarde?!?... Eu tentei… Eu não tive a culpa, eu tentei evitar…”
- “Calma, ninguém te culpa. Ele é que errou. Tem força e ultrapassa isto. A culpa nunca foi tua e tu não mereces sofrer mais com isto.”
Ela chorou, libertou então o grito aprisionado, mas reconstruiu-se e a sua vida é uma página em branco…